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A Genética e a Ética Cristã

Por   /  28 de outubro de 2020  /  Sem comentários

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Nos dias atuais, olhando para a so­ciedade em que vivemos, não é difícil perceber que as mais profundas injusti­ças sociais (nas áreas econômica, políti­ca e financeira) têm suas origens principalmente no problema da liberda­de. Todos querem ser livres e felizes; todos querem ser ricos, possuir bens e propriedades, mas poucos conseguem, dentro desse processo, ver e respeitar o limite onde termina sua própria liber­dade e começa a liberdade do outro.

Na área científica, o problema não é diferente. Em um país como o Brasil, onde a legislação não tem conseguido acompanhar os avanços da ciência, sem­pre fica difícil saber o que virá pela frente. As técnicas de inteligência ar­tificial já alcançaram patamares incrí­veis e sedutores. E quando se trata de genética, o assunto é ainda muito mais surpreendente e grave, porque é o homem lidando com o próprio orga­nismo humano, e brincando de Deus com os mistérios da vida, cujos resul­tados são ainda imprevisíveis.

Já se encontra bastante avançada a técnica que visa, por exemplo, acabar com todas as doenças através de trans­plantes de todos os órgãos do corpo. Nesse sentido, cientistas já estão im­plantando células de fetos humanos em cérebro de macacos e constatando que o resultado é bom.

Uma equipe de cientistas do Hospi­tal de Criança de Boston, nos Estados Unidos1, liderada pelo professor Evan Snyder, anunciou na revista Science que conseguiu, com sucesso, transplantar células nervosas de fetos humanos em fetos de macacos. Usando fetos aborta­dos de quatro meses, os cientistas reti­raram as células nervosas e as implantaram nos fetos de três macacas. As células tiveram excelente adapta­ção, desenvolveram-se e tomaram-se neurônios sadios. Os macacos recém-nascidos foram mortos e autopsiados.

Segundo a equipe, o desenvolvi­mento de neurônios em macacos é uma perspectiva para o tratamento de do­enças neurodegenerativas, como o Mal de Alzheimer e o Mal de Parkinson. “As células desenvolvidas podem ser transplantadas para os pacientes des­tas doenças, para substituir aquelas que estão degeneradas, contribuindo as­sim para o tratamento”, afirma o neuro­logista Orestes Vicente Forlenza, do Laboratório de Neurociências do Insti­tuto de Psiquiatria do Hospital das Clí­nicas de São Paulo. Ele explica que, nessas doenças, os neurônios acabam sendo mortos por proteínas produzidas em excesso. “No Alzheimer, ocorre uma disfunção da memória e, no Parkinson, os movimentos são afetados”, diz ele. “Como os neurônios não se reprodu­zem e, portanto, não são naturalmente substituídos, o transplante de novas cé­lulas nervosas seria uma solução”.

Afirma ainda que os neurônios para transplante têm de ser de fetos por­que a rejeição das células de adultos é muito grande. “Esta pesquisa abre perspectivas muito grandes para tra­tar doenças. E preciso avaliar ape­nas os efeitos colaterais. Até o fim desta década, pode-se ter os resulta­dos dos transplantes em humanos”.

Gabriel Oselka, integrante da Comis­são de Bioética do Hospital das Clíni­cas disse: “Para mim, será inaceitável, por exemplo, que uma família que tenha um paciente com o Mal de Alzheimer resolva engravidar e abortar o feto para transplantar as células nervosas. Mas esta preocupação não deve impedir os estudos. As pesquisas devem prosse­guir, porque podem ajudar muitos paci­entes”. Para Gabriel Oselka, apenas fetos abortados deverão ser utilizados nos transplantes, caso eles deem certo.

A professora do Departamento de Biologia da Universidade de São Paulo, Lygia da Veiga Pereira, também acredita que o estudo é um grande passo no tratamento das doenças. “O fato de que as células do feto humano tenham se desenvolvido bem em um macaco é um bom sinal, já que o macaco é o animal mais próximo do homem e 98% dos nossos genomas são iguais”. A pro­fessora Lygia entende também que o objetivo dos cientistas não é criar macacos inteligentes, mas fazer tes­tes que validem o início da experiên­cia em humanos. “Quando um estudo dá certo em macacos, o teste no homem se justifica. Mas não há uma garantia de que dará certo”.

Lygia lembra que a grande diferen­ça do genoma humano para o do maca­co está justamente nas células nervosas, e alerta para o perigo de que seja criado um mercado de fetos. “Se tudo der certo, existirá o risco de ter gente ven­dendo feto para o transplante, e é por isso que esta questão tem de ser extre­mamente bem controlada”.

O padre Márcio Fabri, da Socie­dade de Bioética, também tem receio das implicações do transplante. “Os abortos são condenáveis, assim como a criação de embriões em laboratórios para serem usados em transplantes”, diz. “Mesmo para sal­var vidas, seria lamentável se co­meçássemos a ter comercialização de fetos. Isto não pode ser aceito” 2.

TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS HUMANOS CLONADOS EM PESSOAS

Para a coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano da Uni­versidade de São Paulo (USP), Mayana Zatz, fabricar fígados, rins, corações e o que mais for preciso, em grandes quantidades, para acabar com as filas dos transplantes, e ainda garantir que a rejeição do novo órgão seja menor, é a finalidade da clonagem de órgãos.

Em entrevista concedida ao Jor­nal da Tarde 3, publicada no dia 26 de agosto de 2001, vimos que Mayana Zatz não se coloca a favor da clonagem humana, nos moldes da clonagem que o médico italiano Severino Antinori pretende fazer a partir de novembro de 2001. Ela se coloca, porém, totalmente a fa­vor do uso de embriões para a pro­dução de tecidos.

Na citada entrevista, a coordena­dora explica o que são as células- tronco, como são desenvolvidas em laboratório e com que finalidade podem ser usadas; fala sobre os genes ativos e diz quais doenças podem ocorrer sem a clonagem. Reunimos abaixo suas principais posições:

SOBRE AS CÉLULAS- TRONCO

  • Células-tronco são células do embrião que podem originar qual­quer tipo de tecido. Conforme o em­brião cresce, elas perdem esta capacidade, especializam-se e pas­sam a ter uma função específica.
  • As células-tronco encontram-se na placenta, no cordão umbilical e no embrião, mas também existem, embora em pouca quantidade, no sangue de adultos. São células ain­da não especializadas, que chama­mos de pluripotentes, e podem se diferenciar em vários tecidos. Ou seja, tornam-se células de coração, de fígados ou de pele, por exemplo.
  • Quando o óvulo se junta ao espermatozoide e forma o embrião, há apenas uma célula. Esta começa a se dividir e, no início, todas são iguais, porém vão se dividindo, até que recebem uma ordem, não sabemos como, para se especializarem. Algumas se transformam em célula de fígado; ou­tras, em célula de ossos etc. Isto ocorre por volta do 14°. dia de fecundação.
  • Não sabemos como é feita a sequência para a especialização, mas os tecidos devem ser formados mais ou menos simultaneamente, porque o embrião cresce como um todo.
  • Quando ocorre a especializa­ção e a célula se diferencia, todas as que se derivam dessas continuam di­ferenciadas. Se uma célula recebe a ordem para ser fígado, as originárias também serão fígado. Não dá para uma célula de fígado virar uma de rim. E aqui surge a primeira grande questão que se deve levantar ao tra­tarmos da clonagem de órgãos.
  • A primeira grande pergunta que devemos fazer ao tratarmos da clonagem é: Como, de uma célula já diferenciada, você conseguirá transformá-la em uma não diferenciada para dar de novo ori­gem a um organismo completo? Esta é a primeira dificuldade técnica de se fa­zer uma clonagem humana.
  • Mas são imensas as perspectivas de que doenças possam ser tratadas com as células-tronco. A grande maioria das doenças genéticas, por exemplo, pode ser tratada, porque você substitui o tecido ruim.

SOBRE OS GENES ATIVOS

  • Se você olhar o DNA, verá que ele é igual em todas as células, seja de pele, de coração ou de fígado. O problema é que os genes (sequências de DNA que produzem proteínas) se expressam de maneira diferente nos tecidos.

– Essa diferença ocorre da seguin­te forma: Vamos imaginar que você te­nha 30 mil genes e que eles são 30 mil lâmpadas. No início, quando você ain­da é um embrião, todas as lâmpadas estão acesas. Quando os tecidos co­meçam a ser formados, as 30 mil luzes continuam lá, mas só algumas perm­necem acesas. As outras ficam apaga­das. Então, dizemos que alguns genes ficam ativos e outros não. As luzes ace­sas são os genes ativos. No fígado, por exemplo, você precisa de genes que produzem enzimas hepáticas, não ne­cessárias em outros tecidos.

  • Como os genes sabem quando devem ou não ficar ativos é também uma ordem que ainda não conhece­mos, contudo ela costuma ser extremamente precisa, um vez que, quando há algum erro, causa doenças graves.
  • Há doenças geradas por genes que ficaram ativos quando não deveriam, e esta é uma outra questão. Há genes que sofrem um imprinting, que é uma impressão diferente, de acordo com a origem materna ou paterna. Há genes onde normalmente só há uma cópia funcional, ou seja, apenas a luz materna fica acesa, por exemplo, e a paterna, apagada.
  • Mais uma vez não sabemos o motivo de isso ser assim, mas se você receber duas cópias da mãe, poderá ter problemas, porque terá duas cópias ati­vas. E sabemos que genes em excesso ou em falta causam problemas sérios.
  • Com a clonagem, o risco des­te erro aumenta, e esta é mais uma preocupação.
  • O médico italiano Severino Antinori pretende reativar todos os genes de uma célula já diferenciada, pro­pondo que se use as células pluri­potentes, já que, teoricamente, elas poderiam se transformar em qualquer tecido, e teriam todos os genes ativados.
  • Sabemos que no organismo adulto essas células são muito pou­cas. No sangue dos adultos, por exemplo, elas existem, mas em quantidades muito pequenas.
  • Onde temos uma quantidade bem maior , além do embrião, é no cordão umbilical e na placenta. Por isso há um grande interesse em usá-los para a ex­tração das células. Estamos começan­do a estudar tanto o cordão umbilical como a placenta. O uso de ambos seria mais fácil, porque não haveria o pro­blema ético, mas não temos certeza de que as células-tronco de placentas e cordões umbilicais tenham a mesma ca­pacidade de se diferenciar em tecidos como as do embrião. Espero que elas tenham, porém não há certezas.

SOBRE AS DOENÇAS QUE PODEM OCORRER SEM A CLONAGEM DE ÓRGÃOS

– Sem se fazer clonagem de ór­gãos, existem as doenças genéti­cas nas quais, por acaso, a criança recebe duas cópias da mãe e não recebe do pai, ou vice-versa.

– São doenças genéticas bem conhecidas, como a Síndrome de Angleman, na qual a criança tem um atraso de desenvolvimento muito grave e nunca aprende a fa­lar. Uma outra é a Síndrome de Prater-Willi, quando crianças afe­tadas têm distúrbio de comporta­mento e compulsão incontrolável por comida. Não chegam a ser do­enças raras. Há incidência de um caso para cada 15 mil nascimentos.

O PARECER BÍBLICO

É bom que o homem cresça em conhecimento. Mesmo que esse co­nhecimento seja meramente secular, a Bíblia não o condena totalmente. No livro de Eclesiastes vemos o escritor alertando apenas para o exage­ro desse conhecimento: “E apliquei o meu coração a conhecer a sabedoria e a conhecer os desvarios e as loucu­ras, e vim a saber que também isto era aflição de espírito. Porque na muita sabedoria há muito enfado, e o que aumenta em conhecimento, aumenta em dor” (Ec 1.17-18).

No livro de Isaías vemos o profe­ta preocupado, não com o conheci­mento em si, mas com o orgulho, com a arrogância do coração de quem tem o conhecimento e se acha muito sábio, muito poderoso, esquecendo-se de que acima dele há um Deus que tudo sabe, que tudo pode, que tudo vê e controla: “Porque confiaste na tua maldade e disseste: Ninguém me pode ver; a tua sabedoria e o teu conhecimento, isso te fez desviar, e disseste no teu coração: eu sou e fora de mim não há outro. Portanto sobre ti virá o mal, sem que saibas a sua origem, e tal destruição cairá so­bre ti sem que a possas evitar, e virá sobre ti de repente desolação, que não poderás conhecer” (Is 47.10-11).

No livro de Jó, a Bíblia mostra que Deus é quem possui o verda­deiro conhecimento, estando Ele no controle absoluto de todas as coi­sas. E o homem, por mais que cres­ça em ciência, jamais conseguirá ensinar ciência a Deus: “Porventura a Deus se ensinaria ciência, a ele que julga os excelsos?” (Jó 21.22).

É importante também que o homem se preocupe com a cura das doenças, mesmo que para isso utilize unicamen­te meios técnicos-científicos (trans­plantes, clonagens etc.). Neste sentido, estamos certos de que os idealizadores dessas técnicas estão primeiramente pensando no bem-es­tar das pessoas que irão fazer uso e se beneficiar no futuro dessa tecnologia. Mas sabemos também que, não só no Brasil, mas no mundo inteiro, a legislação científica normalmente é lenta. Dificilmente consegue acom­panhar de perto os avanços da tecnologia e da ciência. E o pior é que a maioria dos cientistas não sabe que tipo de uso inadequado poderá a so­ciedade mais tarde fazer das ideias e das técnicas que eles hoje estão de­senvolvendo.

Não tem nenhum sentido impedir o avanço da ciência, porque também isto é bíblico – Dn.12.4: “ …a ciência (o saber) se multiplicará”, mas sem­pre fica uma preocupação quando desconhecemos os males reais que poderão dela advir. Sem saber exata­mente quais são as eventuais con­sequências negativas, a longo prazo, do uso indevido dessas e de outras tecnologias que estão na iminên­cia de ser desenvolvidas, ficamos por vezes a indagar até que ponto tudo isso será válido para que o homem seja realmente feliz.

Josh McDowell, pregador, escri­tor e apologista cristão, pensava que os crentes eram todos “loucos”. Ele os depreciava; discutia com eles, sempre argumentando contra a sua fé. Eventualmente descobriu que tais argumentos não tinham consistência, porque Jesus Cristo era de fato Deus encarnado. Em consequência dessa maravilhosa descoberta, tornou-se um pregador nos meios universitá­rios, desafiando à fé aqueles que eram tão céticos como ele próprio o fora. E dele o texto que segue.

“Jesus Cristo está vivo. O fato de eu estar vivo, fazendo as coisas que faço, é evidência de que Jesus Cristo ressusci­tou de entre os mortos. São Tomás de Aquino escreveu: ‘Dentro de cada pes­soa existe uma grande sede de felicidade e propósito na vida’. Quando eu era jovem, queria ser feliz. Não há nada errado com isto. Eu desejava ser um dos indiví­duos mais felizes do mundo. Também queria encontrar um propósito para a vida. Queria saber a resposta de questões tais como: ‘Quem sou eu?’, ‘Porque estou aqui na terra?’, ‘Para onde irei?’.

Mais do que isso, eu desejava ser livre. Queria ser uma das pessoas mais livres do mundo. Mas ser livre, no meu entender, não é sair por aí e fazer tudo que se quer. Qualquer pessoa pode agir assim, e muitas estão agindo. Ser livre ‘é ter o poder para se fazer o que se sabe ser nosso dever’. A maioria das pes­soas sabe o que deve fazer, mas não tem forças para isto. Estão em cativeiro ”.

Notas:

1 Jornal da Tarde de 02 de agosto de 2001.

2 Ibidem;

3 Arquivo de recortes do autor deste artigo;

4 MC DOWELL, Josh – Mais Que Um Carpinteiro Editora Betânia -5a. Edição – MG – 1989, pp. 112-113;

5 Jornal da Tarde de 26 de agosto de 2001;

6 Procurando dar respostas cristãs ao pro­blema do mal na terra, Norman L. Geisler e J Yutaka, em seu excelente livro Reencarnação, levantam estes três pontos.

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ANTENOR DE SOUZA, FONTE: REVISTA “DEFESA DA FÉ” ANO 5 – N° 40

 

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